MCU Revisitado: Pantera Negra




É com muito atraso que publico o último texto do especial de 10 anos da Marvel Studios. Como Pantera Negra era o filme mais recente, foi difícil conseguir uma cópia para revê-lo. As semanas foram passando e fiquei em dúvida se os leitores continuariam interessados ou não, ainda mais depois de Guerra Infinita. Plus, quando a gente quebra o ritmo fica difícil continuar escrevendo. Mas, apesar disso tudo, estamos aqui!

Por coincidência, horas antes de começar este texto, li que o presidente da Marvel Studios, Kevin Feige, voltou a dizer que considera Pantera Negra o melhor filme que eles já fizeram. Não sei se foi sinceridade, ou se foi pra lacrar, mas foi essa a declaração.


Tento aqui organizar os motivos que fizeram o filme solo do T’Challa tornar-se tão grande. Ele começou a fazer barulho antes mesmo da estreia porque era um filme sobre um super-herói negro. Não o primeiro, porque teve Blade (“ele é anti-herói”), mas o último lançamento da Marvel Studios tinha um grande protagonismo negro. Era um filme que mostrava um país africano próspero e tecnológico (“como teria sido se não houvesse a colonização”). Porque todo mundo gostou do Pantera Negra em Capitão América: Guerra Civil. Por aí vai.


É impossível dissociar esse buzz da militância/consciência negra, que nos Estados Unidos é mais expressiva do que no Brasil. Tanto que foi de lá que saiu a maioria dos vídeos com reações aos trailers, ao filme em si, a depois do filme. Até hoje Guerra Infinita não superou o recorde de bilheteria de Pantera Negra lá.  Aqui no Brasil também surgiram várias iniciativas para levar crianças da periferia aos cinemas, a galera foi em grupo para o cinema assistir, muitos posaram para fotos ao lado dos pôsteres, teve muito Wakanda Forever, mas n
ão dá pra comparar o impacto nos dois países, ou cairei em uma longa discussão sobre história, cultura, formação da sociedade. Acho que não cabe aqui, você não está interessado e, mesmo sendo negra, não me considero engajada a ponto de escrever uma dissertação sobre assunto tão complexo. Parei por aqui.





Mas, veja bem, o motivo pelo qual Kevin Feige pode achar Pantera Negra “o melhor filme que nós fizemos” tem a ver com o fato de muita gente ter levado a discussão a outros patamares. “Não é só um filme”, como escreveram em fevereiro e ainda escrevem nas redes sociais. É um manifesto, um acontecimento cultural, tinha um significado para além do novo blockbuster da Marvel Studios. É algo que mexe com o imaginário de uma parcela da população, que toca em pontos sensíveis, que lida com uma cultura ancestral, com a autoestima de pessoas, é até político. Mesmo sendo um blockbuster.


Você pode dizer que a Marvel Studios é politicamente correta, ou tenta PARECER politicamente correta para obter lucro. Fato é que houve um grande cuidado na produção de Pantera Negra porque eles sabiam exatamente onde estavam pisando e o que queriam. Entre outras coisas, contrataram um cineasta negro e jovem, ou seja, capaz de dialogar com esta geração. Ryan Coogler dirigiu e roteirizou o filme. Para você ter ideia do que estou falando, em uma entrevista ele contou que viajou para a África do Sul para conversar com as pessoas, ver o país e saber o que era aquilo. Ao se justificar, ele disse que não é só porque é negro que ele tinha qualificação para fazer o filme. Quer dizer, ser negro nos EUA não é o mesmo que ser no continente africano, nem em todos os países da África, nem no resto do mundo. Ele não pode falar por todos. Leia mais aqui.




Esse cuidado continuou na hora de escolher o elenco, nos figurinos bem elaborados e cheios de referências aos povos do continente, os rituais, os cenários que misturam ancestralidade e tecnologia, até o idioma e o sotaque dos personagens, a trilha sonora.


Um amigo que assistiu depois de mim nem achou o enredo de Pantera Negra tão original assim. Se parar pra pensar, não é mesmo. O diferencial é como a história é contada e os pontos interessantes nos quais ela toca. Wakanda é próspera, mas enquanto se fechava e crescia longe dos olhos do mundo, os povos não privilegiados no seu entorno eram capturados, violentados, explorados, mortos, não necessariamente na mesma ordem.


Engraçado é que cada um que tem acesso ao exterior reage de uma maneira diferente. T’Challa parece ser o tipo que sai de Wakanda doido pra voltar. Nakia, por sua vez, não consegue ficar lá sabendo o que as outras pessoas estão passando do lado de fora daquela redoma. Ela acredita que seu país deveria contribuir de alguma maneira e tenta chamar atenção do rei para isso. Killmonger também acha que Wakanda devia ajudar “os irmãos”, mas de uma maneira muito mais agressiva, devolvendo na mesma moeda tudo que seus ancestrais passaram e que o povo ainda passa por aí. 


T’Challa nasceu em uma família estruturada, nobre, portanto, cheia de privilégios. Sempre teve suporte emocional, intelectual e foi preparado para o cargo que ocupa. No filme anterior, ele era passional, mas resolveu não deixar a vingança consumi-lo e hoje se esforça para ser ponderado, sábio. Do outro lado, nós temos seu primo, N'Jadaka (nome wakandiano de Erik Killmonger). Seu pai era um dos war dogs, os espiões de Wakanda pelo mundo. Ele mora em um conjunto habitacional em Oakland, considerada uma das cidades mais violentas dos Estados Unidos e famosa pelas lutas raciais, sendo o local de origem do movimento dos Panteras Negras. A ideia de armar os oprimidos com o vibranium de Wakanda é dele e custa-lhe a vida, pelas mãos do próprio irmão, inclusive. N’Jadaka, que sempre soube a história de sua família, encontra o pai morto no apartamento perfurado por garras. Fato é que os dois são pessoas completamente diferentes, que trilharam caminhos diferentes, com métodos diferentes, caráteres diferentes (T’Challa não mata a sangue frio, por exemplo). 

Assim como acontece com Xavier e Magneto nos X-Men, os dois têm algo em comum, mas maneiras totalmente diferentes de brigar por aquilo. Chadwick Boseman chegou a achar que T’Challa, de certa forma, pode ser o vilão.
Já da parte do Killmonger, como dizem, “todo vilão é o herói de sua própria história”. Eles são tão lados opostos da mesma moeda que passam pelo mesmo “encontro em outro plano” com os pais, conquistam o mesmo trono, usam o traje do Pantera Negra. Eles se espelham.  

Não posso deixar de falar também sobre as mulheres do filme Pantera Negra. Sabia que elas têm o maior tempo de tela aqui do que em qualquer filme nos últimos 10 anos de Marvel Studios?
 Tem mulher de todo jeito nesse filme, careca que não gosta de cabelo, de dread compridão, mulher diplomata, mulher guerreira, mulher cientista. Em momento algum elas têm sua capacidade questionada em função do gênero. Elas brilham, movimentam a história, têm sentimentos, são reais. Tudo isso acontece na história da maneira mais natural possível, como tem que ser. Parece que estou falando do óbvio, mas não é não. Quando você vê uma menina muito jovem ser a responsável por toda a tecnologia de um país é importante. Quando você vê uma rainha acreditar que outra mulher é qualificada para assumir o posto da maior defesa de seu povo, com um poder ancestral, é importante. Ver mulheres formando uma força militar precisa, comprometida, ocupando cargos de honra, é importante.  





Pantera Negra é, pra dizer o mínimo, um filme muito bonito e com uma mensagem positiva. Penso que as crianças que assistirem, independentemente da etnia, do gênero, etc, vão pelo menos enxergar as coisas de uma maneira diferente. É pouco, é simples, mas faz diferença. Mesmo adolescentes, adultos.  No fim, você acaba torcendo pra toda essa gente e sai tão maravilhado com Wakanda quanto o Bucky, que também não parecia querer sair de lá nunca mais. E não fique triste se você não tenha sido tocado pelo filme na mesma intensidade que algumas pessoas foram. Cada um tem sua própria história, nenhuma visão é igual à outra. Há beleza na diferença. 

FICHA TÉCNICA


Pantera Negra (Black Panther)
Direção: Ryan Coogler
Roteiro: Ryan Coogler, Joe Robert Cole. Baseado nos quadrinhos de Stan Lee e Jack Kirby
Elenco: Chadwick Boseman, Michael B. Jordan, Lupita Nyong’o, Letitia Wright, Danai Gurira, Winston Duke, Daniel Kaluuya, Angela Bassett, Forest Whitaker, Martin Freeman, Andy Serkis...
Duração: 2h14
Estreia no Brasil: 15 de fevereiro de 2018
Estreia nos EUA: 16 de fevereiro de 2018
Orçamento: não divulgado (em 9 de junho de 2018)
Bilheteria: US$ 1,345 bilhão (em 9 de junho de 2018)
Prêmios e indicações: clique aqui 
Fonte: IMDB, Box Office Mojo




Aqui termina o especial MCU Revisitado, em que escrevi sobre os 18 filmes da Marvel Studios lançados nos últimos 10 anos (até a estreia de Vingadores: Guerra Infinita). Espero que tenha gostado de acompanhar minha jornada neste ano de aniversário da Marvel Studios! Se você chegou agora, por este post, saiba que ainda tem muita coisa pra ler. Clique aqui para conferir todos os textos! Muito obrigada.

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